A fragilidade das acusações foi evidenciada pela própria Procuradoria Geral da República, que não pediu investigação contra mim
Paulo Bernardo
Na manchete da edição de 5 de março, esta Folha publicou que Paulo Bernardo estava na lista do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, para ser investigado no âmbito da Operação Lava Jato. O meu rosto foi estampado em fotos na capa do jornal e na página A4.
Desde outubro, trechos selecionados de depoimentos da Lava Jato ocupam a mídia com a citação do meu nome e do da senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR), minha mulher.
Centenas de reportagens foram publicadas com os mesmos elementos: em 2010, Paulo Bernardo Silva, então ministro do Planejamento, teria pedido ao então diretor da Petrobras, Paulo Roberto Costa, uma doação de campanha para Gleisi Hoffmann, candidata ao Senado.
O pedido teria sido repassado a Alberto Youssef para a remessa dos valores. O enredo incluiu ainda outra afirmação: Paulo Roberto Costa teria informado que as letras "PB", escritas por ele em uma agenda, seriam do meu nome.
Reportagens e mais reportagens foram baseadas em informações vazadas de maneira seletiva e ilegal, posto que o processo era formalmente sigiloso. No nosso caso, sabemos hoje, além de seletivo, o vazamento foi falso, pois divulgaram algo que não consta dos autos. A imprensa ignorou tudo isso e desconsiderou o "outro lado" ao veicular tais informações.
Agora, ao ter acesso aos autos anexados pela própria Procuradoria Geral da República, pudemos ver que eles desmentem essa versão. Em depoimento, o ex-diretor da Petrobras afirmou que Youssef lhe teria dito que "havia um pleito" de Paulo Bernardo para a campanha de Gleisi Hoffmann ao Senado.
Paulo Roberto Costa teria concordado com o "repasse", acreditando que o pedido era mesmo de Paulo Bernardo, como dizia Youssef. O problema é que o doleiro desmente isso e afirma que o pedido para a campanha de Gleisi teria partido do próprio Paulo Roberto Costa.
Com versões desencontradas, Paulo Roberto e Youssef foram chamados a depor novamente e ambos reafirmaram o que haviam dito antes. Assim, a contradição se manteve. O caso da caderneta foi esclarecido por Paulo Roberto: a sigla PB constava de uma relação apresentada por Youssef e copiada por ele, Paulo Roberto Costa.
A fragilidade das acusações foi evidenciada pela própria Procuradoria Geral da República, que não pediu investigação contra mim. As referências a Gleisi também são frágeis, sem nada nos depoimentos que possa ligá-la a qualquer pedido (ou entrega) de valores.
Contra a senadora, o procurador incluiu outra acusação, ainda mais frágil: durante o processo, Youssef declarou que o Planalto sabia de tudo - leia-se Lula, Dilma Rousseff, José Dirceu, Erenice Guerra, Antonio Palocci e Gleisi Hoffmann.
Importante lembrar que o processo trata da campanha de 2010, quando Gleisi não exercia cargo público. A senadora nunca teve qualquer tipo de contato com Youssef, assim como eu também nunca tive.
A propósito: Youssef já foi preso e condenado. Livrou-se da cadeia valendo-se da delação premiada e voltou à atividade, tornando-se um dos maiores doleiros do país. Quer dizer, ele já ludibriou a lei e pode supor que ganhou com isso.
Vamos nos defender com a verdade e as armas do Estado democrático de Direito para restaurar a dignidade do nosso nome, duramente atingida pelas precipitações que fermentam o noticiário.
Não prescindimos do papel da imprensa como instrumento de esclarecimento público e de busca da verdade, mas achamos que há algo de muito errado nesse frenético publicar de informações vazadas seletiva, falsa e ilegalmente, sem o direito ao contraditório.
Além de desconsiderarem a presunção de inocência, valor fundamental na democracia, esses procedimentos põem em causa os princípios do processo justo.
Paulo Bernardo Silva, 63, é funcionário de carreira do Banco do Brasil. Foi ministro do Planejamento (governo Lula) e das Comunicações (governo Dilma)