Assassinado por denunciar a corrupção de militares no governo do general Figueiredo
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Memorial da Resistência de São Paulo ------
Nascido em Ibitinga, São Paulo, em 2 de agosto de 1909, José Pinheiro Jobim trabalhou inicialmente como jornalista, tendo sido revisor e redator de A Manhã, do Rio de Janeiro, e redator do Diário de Notícias de Porto Alegre. Contratado pela Agência Meridional dos Diários Associados, foi redator de O Jornal e seu enviado especial à Europa. Atribui-se a Raul Bopp a indicação de José Pinheiro Jobim para a carreira de diplomata em 1938. Em 1958, Jobim começou a trabalhar para a Embaixada do Brasil em Assunção, Paraguai, sendo indicado presidente da seção brasileira da Comissão Mista Brasil Paraguai em substituição a Otávio Conrado. Foi promovido a ministro de primeira classe (embaixador) em 3 de agosto de 1959. Serviu como embaixador do Brasil em Quito, Equador, de dezembro de 1959 até março de 1962, quando voltou ao Rio de Janeiro. Em 18 de fevereiro de 1964, às vésperas do golpe de Estado, Jobim é designado pelo presidente João Goulart para iniciar, com as autoridades paraguaias, o processo de consultas sobre o aproveitamento hidrelétrico do rio Paraná, na altura das Sete Quedas. Serviu depois como embaixador na Argélia de 16 de novembro de 1966 a 13 de setembro de 1968 e junto ao Estado do Vaticano e à Ordem de Malta de 1968 a 1973. Em 1973 foi removido para o Marrocos. Em maio de 1974, após oito meses ausente da embaixada em Rabat, sob licença médica, Jobim foi removido definitivamente para a Secretaria de Estado. A aposentadoria de Jobim é efetivada em 28 de maio de 1974. Em carta dirigida ao então presidente da República, general João Batista Figueiredo, a senhora Lygia Collor Jobim faz, em junho de 1980, um relato detalhado dos acontecimentos que antecederam e sucederam o dia da morte do embaixador José Pinheiro Jobim. No relato, Lygia registra que o embaixador saiu de casa no dia 22 de março de 1979 no início da tarde para visitar um amigo (o jornalista Marcial Dias Pequeno, chefe de Gabinete do governador Chagas Freitas).
Não voltou para casa e a família comunicou à polícia seu desaparecimento. Na manhã do dia 23, receberam o telefonema da proprietária de uma farmácia na Barra da Tijuca, que dizia estar com um bilhete entregue por Jobim havia cerca de meia hora. No bilhete, Jobim comunicou que fora sequestrado em seu próprio automóvel e estava sendo levado para a Barra da Tijuca. Naquela manhã, o delegado titular da 9ª DP, Hélio Guaíba, esteve na casa da família, soube do telefonema e, segundo a viúva, não tomou nenhuma providência apesar de ter indicações claras de seu paradeiro explicado no bilhete: “logo depois da ponte da Joatinga”. O cadáver do embaixador foi encontrado por um gari às 7 horas da manhã do dia 24 de março. Em depoimento à CNV, Lygia Maria Collor Jobim faz a seguinte afirmação: “Meu pai serviu no Paraguai, entre os anos de 1957 e 1959, logo no começo das conversações sobre a criação de Itaipu (Sete Quedas). Aposentado, começou a escrever suas memórias, onde pretendia denunciar a corrupção que envolvia essa solução das Sete Quedas e sobre a qual possuía forte documentação. Mais tarde, creio que em fevereiro ou janeiro de 1964, ele foi enviado pelo presidente João Goulart numa missão especial ao Paraguai. De lá voltando, eu sei que ele apresentou um relatório (...). A documentação que ele tinha e que pretendia utilizar nas memórias para provar o que estava contando misteriosamente desapareceu de dentro da casa da minha mãe. Nós não sabemos precisar em que data. (...) Alguns amigos sabiam que ele estava escrevendo este livro. Ele, uma semana antes de sua morte, foi a Brasília para a posse do chanceler Saraiva Guerreiro e a cerimônia de posse do presidente Figueiredo. Lá ele comentou com algumas pessoas o que estava fazendo. E o senador Gilberto Marinho, que era muito amigo da família, chamou-o num canto e pediu que ele, por favor, parasse com aquilo porque as pessoas que ele ia denunciar estavam ali presentes na recepção.”
A missão do embaixador José Pinheiro Jobim ao Paraguai, em fevereiro de 1964, ocorreu no contexto das negociações entre o Brasil e a URSS durante o governo João Goulart, para construção da hidrelétrica de Sete Quedas com tecnologia e financiamento soviéticos. Seria como que uma réplica, na América do Sul, do modelo de parceria que viabilizou o projeto de Assuã (ou Alto Assuã) no Egito. Outra linha de investigação possível em 1979, para a redação de um livro com revelações sobre Itaipu, poderia tomar por foco as alegações de sobrepreços nas obras civis da hidrelétrica. Elas aparecem em trecho do depoimento do Coronel Alberto Carlos Costa Fortunato, o qual veio a público em 1996 com o lançamento do livro A direita explosiva no Brasil. Todos esses fatos ocorreram durante o governo do general João Baptista de Figueiredo, antigo chefe do SNI, durante o qual se sucederam, principalmente na cidade do Rio de Janeiro, atentados terroristas contra alvos os mais diversos, cuja autoria só agora começa a ser elucidada. Nesta série de graves violações aos direitos humanos, o sequestro do embaixador José Pinheiro Jobim em 22 de março de 1979, transcorridos apenas sete dias da posse do general Figueiredo na Presidência da República, foi o primeiro crime a ser perpetrado, em ordem cronológica. Suas características – que se assemelham às do sequestro, em 13 de outubro de 1982, do jornalista Alexandre von Baumgarten, vítima igualmente de tortura e assassinato – levam-nos a crer que se tenha tratado de um crime de Estado, consumado por motivação exclusivamente política.