por Jean Arcon ---------
Outro dia, rolando o feed do Facebook, me deparei com algumas fotos dos escoteiros do mar, um grupo de escotismo de Antonina. As crianças e adolescentes estavam sorrindo, de uniforme, com aquele brilho nos olhos que só quem acredita em algo maior consegue carregar. Na hora, me veio uma lembrança antiga, quase esquecida: a história dos cinco escoteiros antoninenses que caminharam até o Palácio do Catete, na então capital federal Rio de Janeiro.
Milton Oribe, Manoel Antônio de Oliveira, Antônio José Gonçalves, Lídio Santos e Alberto Shtorach Júnior. Eu já sabia o nome deles, claro. Quem ama Antonina do jeito que eu amo acaba colecionando essas memórias. Mas ver aqueles lobinhos do mar me fez entender o tamanho do que aqueles cinco meninos fizeram.
Foi em dezembro de 1941. A cidade atravessava uma crise profunda, depois que o porto e as empresas locais tiveram suas atividades interrompidas. As empresas Companhia de Navegação Costeira e Loide Nacional (ou Lloyd Nacional) operavam no porto de Antonina e eram grandes empregadoras da cidade, especialmente de trabalhadores marítimos, portuários e operários ligados à atividade industrial e logística. O fechamento das operações foi parte de uma política de centralização em Paranaguá, supostamente por razões estratégicas e econômicas — embora muitos na época tenham interpretado a decisão como motivada por interesses políticos.
O desemprego chegou de repente, como uma maré alta, e deixou muita gente sem chão. Uma comitiva tentou falar com o presidente Getúlio Vargas, mas não conseguiu. Foi então que surgiu a ideia improvável: mandar os escoteiros.
E eles foram. A pé. Mais de mil quilômetros. Quarenta e dois dias. Mochilas nas costas, coragem no peito e o nome de Antonina gravado no coração. Dormiram onde dava, comeram o que achavam, andaram por trilhas, barro, rua de pedra, enfrentando o desconhecido. Tudo isso por uma carta. Uma carta que carregava o clamor de uma cidade inteira.
Chegaram ao Rio no fim de janeiro de 1942. Entregaram a carta ao presidente. Foram reconhecidos. Parte das atividades voltou. E, acima de tudo, a cidade ganhou cinco heróis.
Hoje, quando vejo Antonina caminhando em seu próprio tempo — com suas dificuldades, suas vitórias, seus silêncios —, penso neles. Não com saudosismo, mas com inspiração. Porque aqueles meninos provaram que a força de uma cidade não está apenas em seus prédios, ruas ou governos, mas na fé do seu povo.
Eles caminharam por amor. Amor que não grita, que não briga — amor que age. E é esse tipo de amor que ainda pulsa por aqui, em cada pessoa que cuida da memória, que acredita nos jovens, que luta com esperança silenciosa por dias melhores.
Talvez seja por isso que escrevo. Talvez minhas palavras sejam meu jeito de continuar aquela caminhada. Um passo de cada vez, na rua de pedra, tentando lembrar a mim mesmo — e a quem quiser ouvir — que essa cidade vale a pena.
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