UM "URSO" BEM ARMADO

Há, ainda hoje, quem no espaço público ocidental insista em pintar a Rússia como um “tigre de papel”: um país enfraquecido, isolado, condenado a ruir sob o peso das sanções. Essa narrativa, porém, colide cada vez mais com os factos. O lançamento do míssil hipersónico Zircon, agora filmado junto à costa da Síria, é mais do que um teste: é uma demonstração deliberada de capacidade e de vontade. É fundamental que os cidadãos percebam o alcance disto. O Zircon não é um protótipo; é uma arma operacional, extremamente difícil de interceptar, com alcance estratégico e potencial de carga nuclear. A sua exibição em contexto real deve ser lida como um aviso inequívoco: Moscovo está pronta para responder a qualquer ataque que considere vital, seja contra o seu território internacionalmente reconhecido, seja contra infraestruturas como a ponte da Crimeia, que a Rússia entende como parte do seu corpo soberano. Recorde-se que a Rússia carrega a memória de ter sido surpreendida e devastada na Segunda Guerra Mundial. Essa cicatriz histórica traduziu-se numa doutrina clara: nunca mais ser apanhada desprevenida. Ao contrário do que muitos ainda acreditam, a Rússia preparou-se durante décadas para um confronto prolongado - modernizando o seu arsenal, blindando a sua economia contra sanções e habituando a sua população à ideia de resistência. O contraste com o Ocidente é gritante. A Europa, em particular, não está militarmente pronta para um conflito de alta intensidade: arsenais reduzidos, indústrias lentas e sociedades avessas ao sacrifício. A Rússia, pelo contrário, reorganizou-se para sustentar a guerra como um modo de existência. Isto não significa que Moscovo julgue "ser invencível", mas sim que fará tudo para demonstrar de é tudo menos frágil. É, portanto, ilusório - e perigoso - continuar a acreditar que a Rússia é um adversário “menor”, que pode ser empurrado indefinidamente sem consequências. A história ensina-nos que subestimar a resiliência russa é um erro recorrente, e cada vez mais caro. O Zircon foi lançado também para o público ocidental, como quem diz: “Não confundam desejo com realidade. Estamos prontos.” --------------------- João Gomes