Entreguismo descarado: “xepa” de Guedes na Petrobrás inclui 3 refinarias

Às vésperas da crise anunciada do diesel, gestão da estatal insiste em privatizar parque de refino. “Entreguismo burro e criminoso que essa gente pratica”, denuncia Gleisi Hoffmann ---- A segunda-feira (27) começou com Jair Bolsonaro afirmando que compraria óleo diesel da Rússia e terminou com o anúncio de que a Petrobrás mais uma vez tentará entregar três refinarias após fracassar em 2021. No “fim de feira” do ministro-banqueiro Paulo Guedes, as xepas são as refinarias Abreu e Lima (Rnest-PE), Presidente Getúlio Vargas (Repar-PR) e Alberto Pasqualini (Refap-RS), além dos ativos logísticos integrados a elas. Entre as duas notícias, o Conselho de Administração da estatal confirmou a nomeação de Caio Paes de Andrade para a presidência. A medida será contestada judicialmente pela Federação Única dos Petroleiros (FUP) e Associação dos Acionistas Minoritários (Anapetro), por absoluta falta de qualificação de Caio Andrade para o cargo, a não ser a proximidade com Guedes, de quem foi secretário de Desburocratização. O anúncio da gestão bolsonarista da Petrobrás – seja qual for o presidente – faz parte da intensa ofensiva privatista desencadeada por Guedes em maio. Após emplacar no Ministério das Minas e Energia o primeiro responsável por sua catastrófica política econômica, Adolfo Sachsida, e criminosamente entregar o controle da Eletrobrás na Bolsa de Valores, ele corre para liquidar o que puder até o fim do ano. “Vamos privatizar a Petrobrás, fazer vários acordos comerciais. Vamos fazer bem mais do que temos feito até agora”, jurou Guedes em encontro no Fórum Econômico Mundial, no início de junho. Algumas semanas antes, ele criou a Secretaria de Desestatização e Desinvestimento (SDD), para acelerar sua privataria 2.0. A rapinagem cada vez mais explícita do desgoverno Bolsonaro foi alvo de ataques nas redes sociais. “A gente precisando refinar o petróleo aqui pra parar de importar combustível dolarizado e o que o governo Bolsonaro faz? Retoma a venda de três refinarias, entre elas a do Paraná. É um entreguismo burro e criminoso que essa gente pratica”, atacou a presidenta nacional do PT, deputada federal Gleisi Hoffmann (PT). A indignação da deputada é procedente. Em maio, o Brasil importou 1,42 milhão de m³ de óleo diesel, volume inédito para o mês. Considerando os primeiros cinco meses do ano, as importações de diesel já superaram a marca dos 6 milhões de m³ – ou 19,2% a mais que no mesmo período do ano passado. O volume de importação em cinco meses é o maior da série histórica, superando os 5,56 milhões de m³ registrados em 2018. Para evitar a escassez de diesel a partir de agosto, as principais distribuidoras de combustíveis do país aumentaram em mais de dez vezes o número de licenças de importação. Entre produção local e importação, a Petrobrás forneceu 81% do diesel do país nos quatro primeiros meses do ano, percentual inferior ao fornecido pela estatal em 2019 (85,12%) – resultado direto da dilapidação do parque de refino. ---- Deyvid Bacelar: “É como uma xepa de feira”----- A partir de um Termo de Compromisso de Cessação (TCC) acertado em julho de 2019 com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), o plano de “desinvestimento” em refino da Petrobrás prevê a entrega de oito de suas 13 refinarias – quatro já foram negociadas. Em nome da “livre concorrência”, o acordo repassará para o setor privado 50% da capacidade de refino nacional. Nesta terça-feira (28), em audiência na Comissão de Desenvolvimento Econômico da Câmara dos Deputados, o coordenador geral da Federação Única dos Petroleiros (FUP), Deyvid Bacelar, ressaltou a importância das refinarias na regulação e abastecimento em um mercado como o brasileiro, nono maior consumidor de combustíveis do mundo. “Se essas refinarias são privatizadas e os mercados são monopolizados pelo setor privado, nós teremos uma minimização de custos e uma maximização de lucros a partir do Preço de Paridade e Importação (PPI)”, argumenta Bacelar. “Não terá como a União, nem mesmo o Congresso Nacional, trazer uma proposta de regulamentação ou de criação de uma política alternativa ao PPI.” O coordenador da FUP lembrou o caso da primeira refinaria privatizada pelo desgoverno Bolsonaro – a Landulpho Alves (Rlam), na Bahia. Em menos de dois meses, a nova dona, Acelen, anunciou quatro reajustes da gasolina e do diesel, e hoje pratica preços mais altos que a Petrobrás. Avaliada entre US$ 3 bilhões e US$ 4 bilhões, a Rlam foi vendida por US$ 1,8 bilhão para o fundo de investimentos Mubadala, dos Emirados Árabes. A privatização a um preço muito abaixo do valor real deve ocorrer também com as três refinarias agora colocadas à venda, prevê Bacelar. “É um governo que corre para privatizar como se nós estivéssemos na xepa da feira”, comparou o dirigente. “Bolsonaro sabe que vai perder essa eleição. Então, os projetos de privatização que tinham sido guardados na gaveta são mais uma vez divulgados.” Bacelar afirmou ainda que Bolsonaro tenta demonizar a Petrobrás para entregar não apenas as subsidiárias e ativos, mas também a empresa-mãe. Com isso, procura se esquivar da responsabilidade pela carestia dos combustíveis, alimentada por seu descompromisso com a população durante os mais de três anos de “governo”. “Nós temos refinarias que estão paradas desde 2015. Em 2016 o PT saiu do governo e, de lá pra cá, nada foi feito”, criticou. “Se as obras tivessem sido retomadas no início do mandato nós teríamos não só autossuficiência em petróleo, como a autossuficiência em refino. E isso não foi feito”, finalizou. Lava jato e golpe interromperam as obras das refinarias Se a expansão do parque de refino colocado em execução nos governos Lula e Dilma não tivesse sido interrompida pela lava jato e a inflexão estratégica da Petrobrás após o golpe de 2016, o Brasil estaria hoje exportando derivados de alto valor agregado, e não óleo cru. Em vez disso, a Petrobrás transfere o petróleo do pré-sal para outros países refinarem e importadoras venderem aqui produtos cotados em dólar. A política de desinvestimento imposta à Petrobrás após o golpe de 2016, sob pressão máxima do lawfare movido pela força tarefa da lava jato, fez o Brasil perder R$ 172,2 bilhões em investimentos e encerrou 4,4 milhões de empregos – notadamente na construção civil, que perdeu 1,1 milhão de postos de trabalho. É o que aponta estudo do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese). Os técnicos do Dieese revelaram que os investimentos perdidos equivalem a 40 vezes os R$ 4,3 bilhões que o Ministério Público Federal (MPF) diz ter recuperado com a lava jato. Os cofres públicos deixaram de arrecadar R$ 47,4 bilhões em tributos – R$ 20,3 bilhões, em contribuições sobre folhas de salários, “enxugados” pelas demissões. Outro estudo, do Observatório Social da Petrobrás (OSP), revela que, caso todas as oito refinarias que fazem parte do plano de desestatização já tivessem sido privatizadas, estariam vendendo a gasolina por um preço, em média, 19% mais caro do que o cobrado hoje sob a gestão bolsonarista da estatal. O diesel S-10 custaria 12% acima do valor atual, apontam os pesquisadores da entidade. A estimativa é baseada nos valores cobrados pela Acelen na Refinaria de Mataripe (antiga Rlam), na Bahia, antes e depois da privatização, em dezembro de 2021. A projeção mostra que a média da diferença do preço da gasolina e do diesel ao longo deste ano, entre janeiro e maio, seria de 7% e 12%, respectivamente. “Essa simulação mostra que o efeito imediato da privatização da Petrobrás é a subida geral de preços e não a diminuição, como o atual ministro de Minas e Energia (Adolfo Sachsida) quer fazer crer com sua declaração”, concluiu o economista Eric Gil Dantas, do OSP e do Instituto Brasileiro de Estudos Políticos e Sociais (Ibeps). Já pesquisadores do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (Ineep) associam diretamente a queda da produção de derivados da Petrobrás à venda da refinaria baiana, que detém a segunda maior capacidade de refino do país. Entre o primeiro trimestre de 2021 e o primeiro trimestre de 2022, a produção de derivados caiu de 1,82 milhão de barris por dia para 1,72 milhão de bpd. No lançamento das Diretrizes Programáticas do movimento Vamos Juntos Pelo Brasil, na última terça-feira (21), Luiz Inácio Lula da Silva reafirmou a intenção de mudar os rumos da companhia. “A Petrobrás terá seu plano estratégico e de investimentos orientados para a segurança energética, a autossuficiência nacional em petróleo e derivados, a garantia do abastecimento de combustíveis no país”, afirma o texto. O programa defende que a companhia volte “a ser uma empresa integrada de energia, investindo em exploração, produção, refino e distribuição” e frisa um viés sustentável, pregando que a empresa atue também “nos segmentos que se conectam à transição ecológica e energética, como gás, fertilizantes, biocombustíveis e energias renováveis”. ----- Redação PT