O enigma da Síria: como pode se transformar na Primeira Guerra dos BRICS - por Pepe Escobar

Pepe Escobar -------- "O que a Turquia realmente está fazendo? O papel prático da Turquia na ofensiva salafista-jihadista do Grande Idlibistão é o mais obscuro possível. No último fim de semana, o Ministro das Relações Exteriores Hakan Fidan, significativamente também um ex-chefe de inteligência, negou qualquer papel turco. Ninguém – além da esfera da OTAN – acredita nisso. Nenhum salafista-jihadista no noroeste da Síria pode sequer acender um fósforo sem uma luz verde da inteligência turca – já que o sistema de Ancara os financia e os arma. A linha oficial da Turquia é apoiar a “oposição” síria – salafista-jihadista – como um todo, enquanto deplora levemente a ofensiva do Grande Idlibistão. Mais uma vez, a clássica proteção. No entanto, a conclusão lógica é que Ancara pode ter acabado de enterrar o processo de Astana – ao trair seus parceiros políticos Rússia e Irã. Erdogan e Hakan Fidan, até agora, falharam em explicar a toda a Ásia Ocidental – assim como ao Sul Global – como essa sofisticada operação de aluguel de jihadistas pôde ter sido montada pelos EUA/Israel sem qualquer conhecimento da Turquia. E caso isso tenha sido uma armadilha, Ancara simplesmente não tem poder soberano para denunciá-la. O que os fatos mostram é que uma nova frente foi de fato aberta contra o Irã; o acordo Dividir para Governar EUA/Israel tem o potencial de destruir completamente a entente Teerã-Ancara; e os principais ativos russos — principalmente aeroespaciais — terão que ser desviados da Ucrânia para apoiar Damasco. Não há mistério: há anos, Ancara está morrendo de vontade de controlar Aleppo – mesmo que indiretamente, para “estabilizá-la” para negócios (para o benefício de empresas turcas) e também para permitir o retorno de muitos refugiados relativamente ricos de Aleppo atualmente em Türkiye. Em paralelo, ocupar Aleppo também é um projeto americano: neste caso, para minar seriamente o Eixo da Resistência para o benefício de Tel Aviv. O que mais há de novo: o sultão Erdogan – agora um parceiro do BRICS – mais uma vez está na berlinda. Pior: vis a vis dois membros-chave do BRICS. Moscou e Teerã esperam muitas explicações detalhadas. Não há nada que Putin abomine mais do que a traição total. Erdogan tomou a iniciativa e ligou para Putin – introduzindo uma reviravolta: ele se concentrou nas relações econômicas Rússia-Turquia. Após o tsunami de sanções contra a Rússia, a Turquia se tornou a ponte privilegiada e fundamental entre Moscou e o Ocidente. Além disso, há investimentos russos substanciais na Turquia: gás, energia nuclear, importações de alimentos. Ambos os jogadores sempre abordaram a guerra na Síria conectados à geoeconomia.