Brasil veta Venezuela no Brics e contribui para desintegração da comunidade latino-americana de nações

Nicolás Maduro e Vladimir Putin em Kazan, Rússia (Foto: ALEXANDER NEMENOV/Pool via REUTERS) -------------- "O exemplo dado pelo Brasil, nesse instante, é, totalmente, inapropriado" --------------- por César Fonseca - Brasil 247 ----- A diplomacia brasileira entrou em contradição com a própria Constituição brasileira ao vetar informalmente a entrada da Venezuela no BRICS, em sua 16ª reunião, em Kazan, Rússia, presidida pelo presidente Vladimir Putin, na presença de 32 países, candidatos a se integrarem na instituição, que marca emergência de nova divisão internacional do trabalho, pautada pela multipolaridade nas relações globais. Em seu parágrafo único, o artigo 4º do texto constitucional diz, textualmente: “A República Federativa do Brasil buscará a integração econômica, política, social e cultural dos povos da América Latina, visando à formação de uma comunidade latino-americana de nações.” A posição brasileira no BRICS desarticula politicamente a comunidade das nações latino-americanas e afasta possibilidade de liderança do Brasil no cenário continental, enquanto durar – não se sabe até quando – a divergência Brasil-Venezuela. Inegavelmente, há confronto direto na posição do governo brasileiro de contrapor-se à presença de um país latino-americano nessa nova fase das relações internacionais, cujo objetivo explícito é o de negar o unilateralismo imperialista norte-americano, que marca o perfil do mundo ocidental de confronto com as novas tendências da humanidade à cooperação global explícitas em Kazan. O exemplo dado pelo Brasil, nesse instante, é, totalmente, inapropriado, o que foi enfrentado com energia pelo presidente russo, no comando da 16ª reunião dos BRICS, durante entrevista coletiva do líder russo, ao dar balanço do encontro internacional. Para ele, superar tais divergências, relativas à sucessão presidencial na Venezuela, é necessária e urgente, porque o processo eleitoral, do ponto de vista russo e, também, do chinês, foi legítimo. Negá-lo suscita controvérsias na saúde institucional do bloco, a afetar não apenas os relacionamentos políticos nas Américas – do Sul, do Norte e Central – como no âmbito dos novos 13 integrantes do bloco, bem como de 32 outros integrantes a formalizarem sua participação no novo mecanismo impulsionador das relações econômicas globais. Essencialmente, a divisão no BRICS trabalha a favor do inimigo, ou seja, dos Estados Unidos, inconformados com a principal bandeira do bloco, pela desdolarização da economia global, abrindo espaço à cooperação internacional a partir da utilização das moedas nacionais, por intermédio de mecanismos de compensação, tendo o Banco BRICS como fator essencial do processo de facilitar as novas relações de trocas globais. ------------ CHOQUE BRASIL-VENEZUELA É INCOMPATÍVEL COM PLATAFORMA DE INVESTIMENTOS BRICS ------- Também, a diplomacia brasileira, além de ferir a Constituição nacional, bate de frente com a proclamação final de Putin quanto aos propósitos principais do BRICS firmados em Kazan de criar nova plataforma de investimentos para acelerar a integração dos seus membros como pressuposto essencial para alavancar novo mundo multipolar. Da mesma forma, o governo Lula acirra, pelo movimento de sua diplomacia ambígua, de intensificar divergências com a Venezuela, fere os interesses conjunto do novo bloco de poder mundial, sabendo que a contribuição venezuelana é fundamental por se tratar de uma das maiores produtoras de petróleo do mundo. É de se notar igualmente na declaração final de Kazan a incompatibilidade da nova plataforma de investimentos proposta pelo BRICS, a ser puxada pelo Banco BRICS, com os pressupostos neoliberais, que, no momento, dominam a política econômica brasileira. A engenharia financeira que Putin, em traços gerais, apresentou, certamente, com a concordância tácita do grupo ampliado de 5 para 13 membros permanentes do BRICS, somente é compatível com a cooperação crescente entre a totalidade dos membros do bloco. Tal formato cooperativo é, totalmente, incompatível com a agenda econômica neoliberal ditada pelos Estados Unidos à periferia capitalista, de condicionar oferta de empréstimos aos aliados mediante condicionalidades imperialistas que amarram os destinos dos tomadores de recursos aos interesses especulativos de Wall Street, predispostos, sempre, às sanções comerciais quando tais interesses são contrariados. Trata-se, com a formatação do BRICS, de novo paradigma internacional para condução das relações internacionais de troca, cujo pressuposto básico é o do entendimento e do diálogo, algo distante da posição da diplomacia brasileira de rechaçar a presença da Venezuela no BRICS conforme critério político que varia de país para país, em obediência às suas circunstâncias históricas. A ingerência diplomática brasileira que nega a autodeterminação dos povos relativamente à Venezuela tende a virar problema para o BRICS, conforme já visualizou o próprio presidente Putin, desconfiado de que Washington trabalha para dividir o bloco no seu nascedouro. ---------------- DIPLOMACIA AMBÍGUA E CONTRADITÓRIA --------- Sobretudo, causa incômodo e estranheza ao formato institucional do BRICS o critério ambíguo da diplomacia brasileira de vetar a Venezuela como fator subjetivo incapaz de contribuir para o progresso de integração do grupo, conforme argumentação da diplomacia brasileira, enquanto o chanceler Mário Vieira entra em flagrante contradição ao lamentar a ausência da Argentina no BRICS por força da posição fascista, antidemocrática, do presidente Milei. A Venezuela seria um problema, mas a Argentina, sob comando político fascista, pró-Washington, não? Nas próximas etapas de estruturação dos propósitos institucionais relacionados no relatório final de 32 páginas apresentado por Putin à comunidade internacional do BRICS, candidata a ombrear em importância política à própria ONU, a luta política se desenrolará de forma mais intensa, estendendo-se à gerência do bloco, a partir de 2025, sob responsabilidade do Brasil. O bloco foca na reformulação do Conselho de Segurança da ONU para influir nos rumos da paz, para superar as duas guerras internacionais em curso, que lançam dúvidas sobre a saúde financeira do imperialismo americano às portas da falência, como alertou, hoje, o empresário Elon Musk, do X.