Professora dá sua última aula e morre em meio ao colapso da educação terceirizada no Paraná

Aconteceu de novo: Rosane Bobato, professora, morreu em sala de aula em Curitiba. Foto: reprodução/Facebook -------------- blog do Esmael Morais ------ Rosane Maria Bobato encerrou sua jornada nesta quinta-feira (5) como viveu: em sala de aula, lecionando com dedicação e humanidade. Professora de Língua Portuguesa há 29 anos, ela morreu dentro do Colégio Estadual Santa Gemma Galgani, em Curitiba, após passar mal enquanto ainda estava no exercício de sua função. O colégio, que neste ano passou a ser gerido por uma organização social privada, integra o polêmico programa de terceirização da gestão escolar implementado pelo governo do Paraná — modelo que vem sendo denunciado por professores e sindicatos como fonte de adoecimento e desumanização da profissão docente. Rosane não era apenas uma professora experiente. Era ex-diretora da escola, referência entre os colegas e alunos, voz ativa na comunidade. Seu falecimento durante o expediente é, segundo a APP-Sindicato, mais do que uma tragédia: é um grito de alerta sobre um sistema que tem adoecido seus trabalhadores até a morte. --------------- Uma morte que comove e denuncia -------------- De acordo com colegas da escola, Rosane começou a se sentir mal ao final de sua última aula e procurou ajuda na coordenação. Recebeu os primeiros cuidados no local, mas não resistiu. Seu corpo ficou ali mesmo, na escola, como símbolo trágico de uma política pública que tem falhado com quem sustenta a educação. A APP-Sindicato compareceu ao colégio logo após a confirmação da morte. Em nota, a entidade prestou solidariedade, mas também denunciou: “É a segunda professora que morre em sala de aula em menos de uma semana em Curitiba. Isso não é coincidência, é consequência.” A referência é à professora Silvaneide Monteiro Andrade, que morreu no Colégio Cívico-Militar Jayme Canet na última sexta-feira (30), vítima de um infarto fulminante também durante o expediente. -------------- O peso de um sistema que adoece ------------- Não se trata de fatalidades isoladas. As mortes de Rosane e Silvaneide acendem o sinal vermelho sobre as condições de trabalho enfrentadas por professores em um modelo de gestão que privilegia a lógica da produtividade em detrimento da saúde, do afeto e da missão pedagógica. O regime PSS (Processo Seletivo Simplificado), a terceirização da gestão e a militarização de colégios são elementos de um projeto educacional que, segundo educadores, tem fragilizado vínculos, promovido assédio institucional e imposto rotinas extenuantes a um corpo docente cada vez mais adoecido. “Ela morreu porque o sistema a esmagou. A escola deixou de ser um lugar seguro também para quem ensina”, desabafou uma colega de Rosane que preferiu não se identificar. -------------- O luto é coletivo, a reação também ---------- A morte da professora Rosane não ficará apenas nas homenagens. Já há mobilizações sendo organizadas por entidades e coletivos de educadores para que este episódio represente um ponto de inflexão. A comunidade escolar do Santa Gemma decretou luto, e as aulas desta sexta-feira (6) estão suspensas. A comoção se espalha nas redes sociais. Ex-alunos lembram das palavras de Rosane, sua forma apaixonada de ensinar, o olhar generoso com que acolhia cada estudante. “Ela nos ensinou a amar a língua portuguesa, mas também a ser pessoas melhores”, escreveu uma ex-aluna no Facebook. A última postagem de Rosane no Facebook, na terça (3), foi justamente sobre o adoecimento em sala de aula e morte de sua colega de magistério Silvaneide, o que acrescente ainda mais dramacidade ao seu falecimento. -------------- O que resta dizer? ------------ Rosane Bobato se foi dando aula — e isso, por si só, diz muito sobre o estado da educação pública no Paraná. Sua morte não pode ser naturalizada. Não é o destino. É sintoma. É sistema. Se a escola não é mais um lugar de cuidado nem para os professores, em que se está transformando a educação? O Blog do Esmael se junta ao coro dos que não aceitam esse silêncio institucional diante da morte. Nossa missão é transformar luto em luta, memória em denúncia, e tragédia em mobilização por um ensino público digno e humano.