Burguesia precisará de escadas para chegar ao mar em Caiobá. Foto: reprodução/RPC/Globo
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por Esmael Morais em seu blog ----------
Após a forte ressaca que atingiu o litoral do Paraná, formou-se um paredão de areia de até dois metros, segundo medição da Universidade Federal do Paraná (UFPR).
O fenômeno expôs falhas na milionária obra de engorda da praia, concluída em 2022, e reacendeu o debate sobre a durabilidade da revitalização orla.
A engorda da praia, que custou R$ 354,4 milhões aos cofres públicos, fazia parte de um projeto que prometia conter a erosão, ampliar o espaço de lazer e proteger a infraestrutura urbana.
No entanto, o mar tratou de lembrar quem manda: ventos de até 60 km/h, vindos do Sul, empurraram as ondas contra o aterro artificial e abriram um degrau monumental na faixa de areia da Praia Brava.
Frequentador do litoral paranaense, o líder sindical Messias Obama ironizou a situação.
“Estou pensando em vender escadas na temporada”, brincou.
Nas redes, Caiobá ganhou apelido de Machu Picchu da burguesia: para ver o mar, é preciso descer degraus de areia e um tanto de soberba.
A Prefeitura de Matinhos confirmou que já mobilizou equipes e maquinário para nivelar a faixa de areia, em operação emergencial das secretarias de Obras e Meio Ambiente.
Em nota, o município pediu que moradores e turistas evitem as áreas afetadas até a normalização do local.
Técnicos acompanham a evolução da maré para definir o melhor momento de intervenção, evitando novos desníveis.
Especialistas da UFPR lembram que o fenômeno é típico em praias com faixa larga e areia solta, mas alertam que a erosão foi acentuada por intervenções mal calibradas.
Desde a conclusão da obra, em 2022, já houve pelo menos três episódios de ressaca severa, o que sugere que o reforço da orla não resistirá sem manutenção constante, e mais investimentos públicos.
Em 2022, a dragagem do fundo do mar despejou três milhões de metros cúbicos de areia sobre a orla, equivalente a 220 mil caminhões.
O trabalho foi vendido como “solução definitiva” pelo governo do Paraná, mas, três anos depois, o mar começou a devolver o material à origem.
A Marinha do Brasil havia emitido alerta de mau tempo no início da semana, confirmando ventos fortes e mar agitado entre os dias 6 e 8 de outubro.
O episódio reacende a discussão sobre o modelo de obras costeiras baseadas em engordas temporárias.
Ambientalistas e técnicos defendem que a natureza deveria ser aliada, não adversária.
Enquanto isso, os veranistas mais abonados, que antes exibiam tênis de grife no calçadão, talvez precisem descer degraus de alumínio para molhar os pés no Atlântico.
A ressaca em Matinhos é metáfora do país: muito dinheiro público jogado na areia, pouca engenharia social e nenhuma autocrítica.
O mar, soberano, devolveu o recado.