Em Gaza, recém-nascidos e bebês prematuros estão morrendo em números alarmantes, uma consequência direta da intensificação dos ataques israelenses e do cerco implacável que transformou a Faixa de Gaza em um cenário de colapso humanitário e um cemitério à céu aberto. A crise não se resume a números abstratos, visto que cada um desses números possui um nome documentado. Não somente, mas ela se materializa em hospitais superlotados onde a infraestrutura vital foi aniquilada, deixando os mais vulneráveis sem qualquer chance de sobrevivência. Em apenas uma semana, o Hospital Nasser, em Khan Younis, testemunhou a morte de sete bebês, sendo quatro natimortos e três em incubadoras, vítimas da combinação letal de desnutrição materna, medo, deslocamento e escassez de medicamentos.
O sistema de saúde de Gaza, que seria a única esperança para estes recém-nascidos, está sendo sistematicamente destruído. A ofensiva israelense não apenas causa vítimas diretas, mas ataca deliberadamente a capacidade de resposta médica, tornando mais da metade dos hospitais inoperantes. As poucas unidades que ainda funcionam operam à beira do colapso, sob ataques e com uma taxa de ocupação de leitos que chega a 300% em algumas instalações, como o hospital Al-Ahli. Essa destruição intencional do sistema de saúde significa que não há lugar seguro para os doentes, feridos ou para as mulheres em trabalho de parto, selando o destino de inúmeras vidas inocentes. Quem não morrer no bombardeio, poderá morrer depois ao buscar ajuda.
Para os bebês que nascem prematuramente, a situação é ainda mais desesperadora. Nas unidades de terapia intensiva neonatal, a falta de equipamentos essenciais atingiu um nível crítico. A escassez aguda de incubadoras força as equipes médicas a tomar decisões impossíveis, como colocar entre três e cinco bebês prematuros em um único aparelho projetado para apenas um. Esta prática, evidentemente fruto do desespero, aumenta exponencialmente o risco de infecções e complicações, transformando as incubadoras, que deveriam ser berços de vida, em focos de morte iminente devido à sobrecarga e à falta de suprimentos básicos.
Entretanto, a crise começa muito antes do nascimento. Para as 55.000 mulheres grávidas em Gaza, levar uma gestação saudável até o fim tornou-se uma tarefa quase impossível. A falta de acesso a alimentos, água potável, cuidados médicos e segurança transformou a gravidez em um período de risco extremo. Hospitais em cidades como Rafah e Khan Younis, que deveriam ser santuários para o parto, enfrentam bombardeios constantes e uma escassez de tudo, desde combustível para geradores até alimentos e pessoal treinado, o que inviabiliza o acompanhamento pré-natal e o parto seguro. A preocupação em Gaza não se trata de enxovais “instagramáveis”, nem de qual será a decoração para o quarto do bebê ou qual nome da moda escolher, mas sim se a mãe não sofrerá um aborto causado pela fome ou estresse em meio às bombas; se o hospital não será bombardeado na hora do parto e se o bebê não morrerá de inanição logo nos primeiros dias. Isso, claro, se o bebê nascer com vida.
As estatísticas refletem a profundidade da catástrofe. Desde o início do conflito, a taxa de abortos espontâneos em Gaza aumentou em 300%, um número que evidencia o trauma físico e psicológico imposto às gestantes. Além disso, apenas sete dos 18 hospitais remanescentes na Faixa de Gaza ainda oferecem cuidados obstétricos e neonatais de emergência. Essa carência forçou a criação de centros de parto improvisados em acampamentos, locais sem pessoal treinado ou recursos e higiene adequados, onde as mulheres dão à luz em condições que as expõem a graves riscos de infecção e hemorragia.
Paralelamente ao colapso da saúde, uma fome avassaladora foi oficialmente declarada em Gaza, e seu impacto é particularmente cruel para as crianças. O relatório do Comitê de Revisão da Fome (FRC) da Classificação Integrada da Fase de Segurança Alimentar (IPC) não nos deixa dúvidas: a fome (Fase 5 da IPC) já é uma realidade no Governorado de Gaza. O relatório enfatiza que esta catástrofe é inteiramente provocada pelo homem e, portanto, poderia ser interrompida e evitada. Podemos concluir de acordo com o relatório que a fome é o resultado direto de ações que impedem a chegada de ajuda humanitária e destroem os meios de subsistência da população, como abordamos exaustivamente toda semana há anos em nossas páginas e site.
A destruição de terras agrícolas, estufas e barcos de pesca, juntamente com os danos massivos à infraestrutura logística, como estradas e armazéns, aniquilou a produção doméstica de alimentos. A população, portanto, depende de importações e ajuda humanitária que são severamente restringidas. Quando ajuda humanitária externa tenta entrar em Gaza, são interceptadas pelo exército israelense. Essa combinação de fatores criou uma escassez catastrófica de alimentos, empurrando a população, e especialmente as crianças, para a inanição e um desaparecimento gradual da demografia da região.
A desnutrição severa interage com as péssimas condições de vida, criando um ciclo vicioso de doença e morte. O colapso das infraestruturas de saneamento e água, somado à superlotação em abrigos improvisados, intensifica a exposição a patógenos e doenças transmitidas pela água. Para um corpo já enfraquecido pela fome, uma simples diarreia pode ser fatal, segundo relatório da IPC. Esta interação letal entre desnutrição, infecção e condições de vida extremas está a acelerar a mortalidade, tornando a morte por causas evitáveis uma ocorrência diária em Gaza.
As crianças, pela sua fragilidade natural, são as vítimas mais visíveis e vulneráveis desta fome deliberada. Os crescentes relatos de mortes relacionadas à desnutrição confirmam que os mais frágeis da sociedade, incluindo crianças e idosos, já estão a sucumbir. O corpo de uma criança desnutrida não tem reservas para combater doenças ou para se recuperar de ferimentos. A tendência, segundo o relatório da IPC, é que essas mortes aumentem exponencialmente, começando pelos mais vulneráveis e se espalhando para o resto da população, à medida que a crise se aprofunda.
A ofensiva em Gaza, portanto, representa uma sentença de morte, onde os ataques militares diretos se somam a uma política de fome e à destruição da infraestrutura de saúde para criar uma catástrofe humanitária sem precedentes, que nos proporcionam imagens tenebrosas como a de um bebê com etiquetas indicando a data de seu nascimento e a de sua morte, com apenas um dia de distância entre uma e outra. A comunidade internacional assiste a um cenário onde as forças israelenses não apenas matam, mas também criam condições de vida impossíveis, visando empurrar os palestinos para fora de suas terras através de genocídio e limpeza étnica. Atos meramente simbólicos e eivados de demagogia – como se ausentar durante o discurso do primeiro-ministro israelense –, tentando limpar a própria consciência e a imagem do escrutínio impiedoso dos historiadores do futuro, não são suficientes. Sem uma intervenção radical e urgente, o destino de Gaza é a aniquilação total.
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Referências:
ALATSAS, Zoe. PREGNANCY CRISIS IN GAZA. The Borgen Project, 2025.
FAMINE REVIEW COMMITTEE: GAZA STRIP, AUGUST 2025. Integrated Food Security Phase Classification (IPC), 22 ago. 2025.
GAZA City offensive is a death sentence for one million Palestinians. MSF (Médecins Sans Frontières), 2025.
GAZA'S premature babies face death as medical supplies run out. ILKHA, 2025.
INFANT deaths, miscarriages: Israeli war on Gaza's newborns. TRT World, 2025.
História Islâmica