‘Braço forte, mão leve’: investigações apontam graves suspeitas de corrupção por oficiais do Exército
A Nova Democracia ----------
Documentos citados na investigação, mostram que oficiais envolvidos em fraudes foram promovidos a posições estratégicas durante a gestão de Jair Bolsonaro. Um dos casos mais emblemáticos é o do major Washington Luiz de Paula, conhecido como “Pica-Fumo”, que chegou a presidir a comissão de licitação no período em que ocorreram as principais irregularidades.
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Denúncias de corrupção nos quartéis foram recentemente expostas pela Revista Sociedade Militar, colocando sob holofote os privilégios de casta de altos oficiais das Forças Armadas. As investigações envolvem fraudes em licitações, pagamentos indevidos a oficiais em formação e, ademais dos já largos e vultuosos benefícios concedidos a oficiais generais, a prestação de novos auxílios milionários aos altos oficiais. Exposição de um verdadeiro contraste com a realidade dos praças do exército.
No centro das acusações está a Operação Química, conduzida pela Procuradoria de Justiça Militar em Bagé (RS). A investigação, em curso desde 2019, apura fraudes em licitações para compra de gêneros alimentícios por organizações militares, tendo como responsáveis pelas licitações oficiais do exército. Segundo o Ministério Público Militar, há evidências de que fornecedores entregavam produtos diferentes — ou em condições inferiores — daqueles contratados, a fim de inflar o lucro dos oficiais envolvidos pelos desvios nas licitações.
Em paralelo, a Revista Sociedade Militar revelou que mais de 125 oficiais, ainda quando cadetes na Academia Militar das Agulhas Negras (AMAN), receberam pagamentos indevidos. Segundo documentos obtidos pela revista, cadetes que fizeram cursos como paraquedismo e operações na selva foram remunerados como se tivessem concluído cursos de “aperfeiçoamento” — adição que, pela lei, só poderia ser paga a oficiais já formados, não a aspirantes. Após a graduação, esses militares foram distribuídos por diversas unidades do Exército, o que pode ter inflado ainda mais outros benefícios calculados a partir de remunerações já “superfaturadas”.
Outra denúncia revelada pela revista aponta que o Tribunal de Contas da União (TCU) concluiu fortes indícios de fraude na licitação conduzida pelo Exército com contratos de telemedicina. Segundo a apuração, militares teriam favorecido uma empresa para prestação de serviços, em processos opacos que indicam benefícios de contrapartida para os oficiais.
Caso emblemático de impunidade com generais e altos oficiais foi o “Escândalo Verde-Oliva”, que após mais de uma década de investigações sobre um esquema milionário de fraudes em contratos do Exército, chegou ao fim sem que qualquer general fosse responsabilizado. O escândalo, que envolveu irregularidades entre 2003 e 2009 no Instituto Militar de Engenharia (IME), movimentou cerca de R$ 38 milhões por meio de empresas de fachada e contratos fraudulentos.
Em abril, o Superior Tribunal Militar condenou cinco oficiais — dois coronéis, um tenente-coronel, um capitão e um major — além de empresários ligados ao esquema. Entretanto, nenhum general foi punido, incluindo o então chefe do setor responsável, o general Rubens Silveira Brochado, cuja denúncia foi rejeitada sob alegação de falta de indícios concretos.
Documentos citados na investigação, mostram que oficiais envolvidos em fraudes foram promovidos a posições estratégicas durante sua gestão. Um dos casos mais emblemáticos é o do major Washington Luiz de Paula, conhecido como “Pica-Fumo”, que chegou a presidir a comissão de licitação no período em que ocorreram as principais irregularidades. O militar também enviou um e-mail à cúpula do Exército mencionando pagamentos de propina e citando generais, material reconhecido pelo Ministério Público Militar como autêntico. Apesar das denúncias, o major permaneceu na ativa e só passou para a reserva em 2022. O Exército afirma ter adotado medidas administrativas, mas não detalha quais.
Altos oficiais do exército vivem com privilégios de casta
Os diversos casos de corrupção na caserna, por mais que exponham a responsabilidade de altos oficiais e generais nos desvios, estes últimos já gozam de plenos privilégios com seus cargos, independente de fontes de enriquecimento ilícito.
Durante o governo de Bolsonaro e generais, realizou-se a Reestruturação da Carreira Militar em 2019 (Lei 13.954/2019), especialmente criticada por criar vantagens substanciais para os oficiais de alta patente e manter praças à margem dos benefícios. Por exemplo: “Adicional de Disponibilidade Militar”, uma gratificação que só decorre da dedicação exclusiva à Força, podendo chegar a 41% do soldo para generais. Há também um “Adicional de Habilitação”, vinculado à realização de cursos de aperfeiçoamento ou altos estudos, que foi significativamente elevado para patentes mais altas. No momento da transferência para a reserva, os generais podem receber uma indenização de até oito vezes o soldo. A gratificação de representação, paga a oficiais em cargos de comando, também se tornou mais generosa. Além disso, generais já acumulavam outros benefícios: auxílio-moradia, uso de veículos oficiais com motorista, diárias elevadas para viagens, entre outros.
Um relatório do Ministério da Defesa, citado pela Revista Sociedade Militar, chegou a afirmar que a reestruturação de 2019 “não privilegiou um segmento em detrimento de outro”, mas os números reais vão na via oposta, revelando altos privilégios para oficiais e generais.
