O jantar ao acaso do tenente da Rota que ergueu barricadas contra a Polícia Federal

Guilherme Derrite (Foto: Marina Ramos/Câmara dos Deputados) ------------------- por Moisés Mendes no Brasil 247 ----- O encontro de Guilherme Derrite com Eduardo Cunha e Arthur Lira é o tema do artigo de Moisés Mendes ----------------- Foi muito azar. Guilherme Derrite saiu abatido da Câmara na quarta-feira, depois de fracassar na sabotagem à Polícia Federal. Afrouxou o nó da gravata, respirou fundo e decidiu beber um vinho português no Restaurante Manuelzinho. Ficaria sozinho num canto, pediria um bacalhau à moda do mestre e aguardaria a ligação de Tarcísio. Era o telefonema que mais temia, depois daquele dia tenebroso. Teria que dizer ao chefe que as barricadas que tentara erguer na Câmara, para conter o avanço da PF em direção às facções sócias da extrema direita, haviam fracassado. Ele era um fracassado. Entrou no restaurante e viu Eduardo Cunha ao fundo. Fez que não tinha visto, mas percebeu que o ex-deputado chamou o garçom e pediu que avisasse o recém chegado. O garçom foi até Derrite, que não teve como não ir. A noite seria terrível. Cunha foi um poderoso presidente da Câmara, tão poderoso que levou adiante, com estrondoso sucesso, o golpe contra Dilma. Mas havia tombado por decisão dos próprios parceiros. Foi cassado pelos que o apoiaram na empreitada do impeachment. Depois foi condenado por corrupção, mas anularam a condenação. Derrite não sabia direito qual seria a situação de Cunha naquele momento. Mas sabia que ele estava abandonado pela turma e que havia tentado voltar à Câmara, depois de liberado pelo STF. Sabia até o seu número de votos como candidato a deputado pelo PTB de São Paulo: 5.044. Não era uma noite para encontrar Eduardo Cunha, um enjeitado que não poderia ser visto como exemplo de nada ou como alguém capaz de aconselhar um tenente da Rota que sempre atirou para matar e também estava ali derrotado. Cunha era um capincho tomado de carrapatos, que desfazia qualquer rodinha de conversa. Pois Derrite estava se acomodando na cadeira quando chegou Arthur Lira. Cunha percebeu a presença do ex-presidente da Câmara e chamou o garçom de novo. Fez o mesmo pedido: que avisasse Lira que ele e Derrite estavam ali. Os dois, Cunha e Derrite, perceberam que Lira havia notado a presença da dupla, tanto que disfarçou e olhou para o lado, mas sem muita sutileza. Mas não havia o que fazer e Lira sentou-se à mesa. Formou-se então o cenário da foto já histórica, com os três acomodados do mesmo lado, como se tentassem repetir, com apenas um trio, a cena da Última Ceia de Da Vinci. São três na mesa e há oito ou nove taças diante deles, para vinho e para água, o que poderia indicar que Eduardo Cunha esperava mais gente. Pois Derrite estava se acomodando na cadeira quando chegou Arthur Lira. Cunha percebeu a presença do ex-presidente da Câmara e chamou o garçom de novo. Fez o mesmo pedido: que avisasse Lira que ele e Derrite estavam ali. Os dois, Cunha e Derrite, perceberam que Lira havia notado a presença da dupla, tanto que disfarçou e olhou para o lado, mas sem muita sutileza. Mas não havia o que fazer e Lira sentou-se à mesa. Formou-se então o cenário da foto já histórica, com os três acomodados do mesmo lado, como se tentassem repetir, com apenas um trio, a cena da Última Ceia de Da Vinci. São três na mesa e há oito ou nove taças diante deles, para vinho e para água, o que poderia indicar que Eduardo Cunha esperava mais gente No dia em que queimou pneu no meio da rua para tentar afugentar a Polícia Federal, em que cometeu barbeiragens que um Arthur Lira não cometeria, naquele dia Derrite encontrou-se ao acaso com Eduardo Cunha e Lira, dois especialistas em manobras nos subterrâneos da Câmara. Um fracassado e o outro ainda influente e poupado pelo Supremo e sem sintomas de que possa estar sofrendo da síndrome do ex-presidente da Câmara. O temido tenente da Rota, o soldado infalível que não erra um tiro, que mirava na cabeça, esse militar de linha de frente pensava na situação dos caras ali sentados quando o telefone tocou. O garçom ouviu quando Derrite colocou a mão em concha no celular e falou baixo: ‘Não deu certo, chefe’. Ouviu alguma coisa e balbuciou: ‘Mas eu mereço uma segunda chance’. Fez-se um silêncio de quatro segundos e ele largou o celular na mesa, com o braço mole, passando a outra mão na testa. Foi consolado por Lira e Cunha. Quem estava no restaurante viu que nesse momento os três viraram o rosto para a porta. Flavio estava chegando. Cunha chamou o garçom, disse alguma coisa, e o garçom foi em direção a Flavio, que não aparece na foto porque o fotógrafo já havia ido embora. A foto dos três na mesa redonda do Manuelzinho é mais uma amostra cristalina de que encontros fortuitos, sem combinações, provocados por sorte ou por azar, acontecem a todo momento. Os três saíram para jantar na solidão e aconteceu o que sabemos. Mesmo assim, muitas dessas fotos são usadas contra os personagens retratados como prova de que aquelas pessoas fazem parte das mesmas facções. Não é bem assim. O acaso ronda a velha direita, o centrão e a extrema direita.