Crianças são expostas a armas de alto potencial de fogo dentro de colégio cívico-militar em Colombo

Evento contou com a presença da chefia do NRE e de políticos da região que, em suas publicações nas redes sociais, omitiram imagens da exibição de armas feita às crianças no local ---------------- A APP-Sindicato recebeu imagens de crianças sendo expostas à cultura da violência com a exibição de armamento pesado dentro do Colégio Cívico-Militar Vinicius de Moraes, no município de Colombo, Região Metropolitana de Curitiba,nesta quarta-feira (3). Esse novo episódio de absurdos da militarização da educação no Paraná, imposta pelo governador Ratinho Jr. (PSD), acontece menos de uma semana depois de viralizar nas redes sociais um vídeo que mostra estudantes do Colégio Cívico-Militar João Turin, de Curitiba, cantando uma música que faz apologia ao ódio e à morte de pessoas negras e da periferia. ------------------- Assista: https://www.instagram.com/reel/DR2Y8N0kvkD/?igsh=Mnc4dWtzeHh6YXpj -------------------- As imagens do vídeo de Colombo mostram crianças aglomeradas em frente a uma mesa, montada no ginásio da escola, onde estão dispostos pelo menos cinco fuzis, uma pistola e outras armas utilizadas pelo batalhão de Rondas Ostensivas de Natureza Especial, unidade de elite da Polícia Militar do Paraná (PMPR). O vídeo também mostra que as crianças usam o celular para tirar fotos do armamento, enquanto são observadas por um policial militar, sem a presença de profissionais da educação. Diante da gravidade dos fatos, a APP-Sindicato denunciou as imagens ao Ministério Público, à Defensoria Pública e à Controladoria Geral do Estado. “A escola tem como papel central a humanização, a construção do respeito à diversidade e a todas as pessoas. O modelo cívico-militar vai na contramão deste grande objetivo. Esses vídeos, que nós tivemos acesso e denunciamos, são apenas algumas das provas e das muitas denúncias que temos feito sobre este modelo, seja sobre assédio, violência, assim como a incitação à violência e ao racismo. Por isso, nós continuaremos denunciando e tomando todas as medidas cabíveis para que a escola volte a ser o espaço da construção do respeito e da dignidade humana”, comenta a presidenta da APP-Sindicato, Walkiria Mazeto. De acordo com as informações recebidas, a exibição das armas aos estudantes aconteceu durante um evento que contou com a presença do secretário de Estado da Segurança Pública, Hudson Teixeira, da chefia do Núcleo Regional de Educação da Área Metropolitana Norte, Sílvia Vieira Dias, além de políticos e pré-candidatos(as) do município. Em outras imagens e publicações divulgadas nas redes sociais, é possível observar que a atividade reuniu centenas de crianças no ginásio da escola, mas não há explicações de qual a relação da atividade envolvendo políticos e exibição de armas teria com a aprendizagem das crianças. No perfil do NRE em uma rede social, a descrição de um vídeo sobre a atividade só diz que a chefe da repartição, Sílvia Vieira Dias, esteve na escola para acompanhar o evento e que a “programação incluiu a apresentação do efetivo do BOPE com os cães, demonstração de equipamentos e uma homenagem aos militares do BPEC e ao Corpo de Bombeiros”. Nas redes sociais do secretário de Segurança Pública, a participação no evento foi publicada nos stories, mas sem detalhes sobre o objetivo da atividade. Hudson Teixeira é quem comandou a ação violenta da PM contra professores(as) e funcionários(as) de escola no dia 29 de abril de 2015, deixando mais de 200 feridos. No perfil de outro político presente no evento, o secretário de Governo, Trânsito e Ordem Pública de Colombo, Professor Alcione, assim como dos demais, as imagens das armas e do local onde elas foram expostas são omitidas. -------------------- “Entrar na favela e deixar corpo no chão” -------- Na última sexta-feira (), a APP-Sindicato recebeu e divulgou imagens chocantes que confirmam as denúncias de doutrinação e violação dos direitos dos(as) adolescentes pelo programa Colégios Cívico-militares, implantado de forma autoritária pelo governador Ratinho Jr. (PSD) no Paraná. No vídeo, estudantes de um colégio estadual de Curitiba entoam um canto com letra que faz apologia ao ódio e à violência, especialmente contra populações periféricas. “Homem de preto, qual é sua missão? Entrar na favela e deixar corpo no chão”, diz um dos trechos cantados pelos alunos(as) enquanto marcham na quadra da escola, sob observação de um militar aposentado. “Absurdos como esse do vídeo não são casos isolados. Desde o início deste programa, temos recebido e denunciado ocorrências semelhantes e até piores em escolas que adotaram o modelo cívico-militar. É chocante ver que a escola pública esteja sendo usada para promover uma doutrinação ideológica extremista, que prega o ódio, a violência, o massacre e o extermínio de comunidades periféricas. Isso é muito grave e reforça a nossa luta contra a militarização da educação e a urgência do Poder Judiciário determinar o fim desse programa ilegal e inconstitucional”, afirma a presidenta da APP-Sindicato, Walkiria Mazeto. O vídeo, publicado nas redes sociais do sindicato, viralizou na internet e virou assunto em todo o país. Autoridades também reagiram. A APP-Sindicato denunciou o conteúdo das imagens ao Ministério Público, à Defensoria Pública e à Controladoria Geral do Estado.
Sem qualificação As escolas cívico-militares começaram a funcionar no Paraná em 2021, após consultas realizadas no ano anterior marcadas por casos de autoritarismo e desrespeito às comunidades escolares. A última consulta ocorreu em 2023 e atualmente o estado possui 312 colégios militarizados, mesmo após o presidente Lula encerrar, em 2023, o Programa Nacional das Escolas Cívico-Militares (Pecim), criado em 2019 pelo ex-presidente Jair Bolsonaro. O programa prevê a contratação de policiais militares aposentados para atuar e interagir com os(as) estudantes nas escolas. Os(as) militares são chamados de monitores militares, mas em muitas escolas são conhecidos como diretores(as) militares, em sobreposição à autoridade dos(as) profissionais da educação. Esse conflito também se demonstra na remuneração. Ratinho Jr. paga aos militares a quantia mensal de R$ 5,5 mil. Mesmo não tendo formação ou conhecimento sobre processo pedagógico, educação e interação com adolescentes e jovens, eles recebem mais do que os(as) professores(as), que têm o piso atual fixado em R$ 4,9 mil, para jornada de 40 horas semanais, e mais ainda do que os(as) funcionários(as) de escola que tem formação e qualificação para interação com os estudantes, os Agentes II, cujo piso salarial é R$ 4 mil. ----------------- Não à militarização ------------- Desde o anúncio do modelo, a APP-Sindicato tem atuado na resistência, denunciando os problemas da iniciativa para estudantes, educadores(as) e para a qualidade do ensino. O sindicato também tem acompanhado e notificado casos de violência nas unidades militarizadas. Uma reportagem publicada em 2024 pela APP-Sindicato ouviu estudantes indignados(as) com as mudanças impostas a partir daquele ano após em escolas que abandonaram o modelo democrático e passaram a adotar o cívico-militar. Os(as) adolescentes relataram que foram obrigados(as) a cumprir uma série de regras estéticas consideradas abusivas e que não possuem qualquer relação com o ensino. “Me sinto péssimo, porque eles estão querendo mudar a personalidade das pessoas. Eles falaram que quem não tirar os piercings e os bonés vai ter que mudar de escola. O ambiente no colégio está péssimo. A gente vai para a escola estudar e aprender, mas chega lá, parece uma prisão”, contou um estudante. As regras constam no manual das escolas cívico-militares. O documento alega que a padronização do cabelo e a proibição de acessórios seriam “aspectos educacionais relacionados com a higiene, boa aparência, sociabilidade, postura, dentre outros”. Mas, para os(as) estudantes, a prática é abusiva e promove discriminação contra a identidade de grupos sociais, como pessoas negras e LGBTI+. Inconstitucional Uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), movida pelo PT, PSOL e PCdoB, pede que o Supremo Tribunal Federal (STF) declare a inconstitucionalidade da Lei 20.338/2020, que criou o Programa Colégios Cívico-Militares do Paraná, e do art. 1º, inciso VI, da Lei 18.590/2015, que proíbe eleições para direção nas escolas cívico-militares. Em manifestação no processo, a Advocacia-Geral da União (AGU) considerou que o programa de escolas Cívico-Militares de Ratinho Jr. é inconstitucional. O parecer da AGU argumenta que estados não podem criar um modelo educacional que não esteja previsto na Lei de Diretrizes e Bases da Educação. Além disso, o órgão ressalta que a Constituição Federal não prevê que militares exerçam funções de ensino ou de apoio escolar. O relator do caso no STF é o ministro Gilmar Mendes.